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Documentário propõe narrativa sobre o legado das Jornadas de Junho

24/08/17 às 16:34 Atualizado em 23/01/18 as 17:14
Documentário propõe narrativa sobre o legado das Jornadas de Junho

Prever a reação de uma plateia a determinada obra de arte é sempre um ato impreciso, mas se depender do histórico recente do Festival de Brasília – notadamente o do ano passado, com os xingamentos em alto e bom som a deputados conservadores durante as sessões de Martírio e Entre os Homens de Bem -, a exibição do documentário Operações de Garantia da Lei e da Ordem, marcada para o próximo dia 23 de setembro no evento brasiliense, dentro da mostra Terra em Transe, tem potencial para provocar comoção semelhante.

Dirigido por Júlia Murat em co-direção com Miguel Antunes Ramos, o trabalho foi apresentado em uma versão ainda não finalizada (“work in progress”) em sessão da 11ª CineBH – Mostra Internacional de Cinema de Belo Horizonte. Com foco na cidade do Rio de Janeiro, a obra retrata o período entre junho de 2013 e julho de 2014 utilizando apenas materiais de arquivo publicados em algum sistema de comunicação (TV, internet, rádio, material impresso e distribuído). Eles quase sempre mostram ou reverberam os acontecimentos ligados às inúmeras manifestações ocorridas na época.

Quatro anos depois das Jornadas de Junho, o que está nítido no campo político, inclusive na preparação para a próxima corrida presidencial, é que ainda há uma disputa a respeito do legado daqueles protestos. O que o filme de Júlia e Miguel propõe, através de intertítulos e da forma como contrapõe os relatos sobre os mesmos fatos, é uma narrativa própria sobre a cooptação da força progressista das ruas por um ideal conservador, não se furtando a apontar a reação de Dilma Rousseff aos protestos como partícipe da volta do ideal de Ordem e Progresso trazido pelo governo Temer.

Assim, o interesse gerado pelo filme não passa necessariamente pela novidade daquelas imagens, muitas delas conhecidas por quem acompanhou de perto aqueles protestos, como a truculência policial, a prisão e a criminalização de manifestantes através de flagrantes forjados ou de acusações arbitrárias, a ação de black blocs, a morte do cinegrafista da TV Bandeirantes. Este viés mais analítico, que traz influências de obras como a do alemão Harun Farocki (Videogramas de uma Revolução), é um diferencial importante para separar o trabalho das obras cinematográficas pouco instigantes que foram lançadas até aqui a respeito das Jornadas de Junho.

Talvez o filme brasileiro que melhor tenha refletido sobre os acontecimentos de junho de 2013 não traga sequer uma imagem sobre estes fatos. Trata-se de No Intenso Agora, trabalho de João Moreira Salles que analisa o vazio deixado em diversas localidades do mundo após a euforia vivida em alguns momentos de 1968. O filme de João mostra como Cohn-Bendit, principal líder estudantil da ocasião, aceitou ser financiado por uma revista numa viagem à Alemanha. Em narração em off, o diretor aponta como tal fato simbolizava a cooptação pelo status quo de um movimento que em pouco tempo iria se esfacelar.

A cena volta à mente quando, em Operações de Garantia da Lei e da Ordem, são mostradas imagens de um debate entre membros da mídia alternativa e da grande mídia ainda no bojo das grandes manifestações. No momento em que um plano mais aberto é mostrado, notamos que o evento é patrocinado por grandes empresas e que o cenário inclui um pote de café cenográfico fazendo propaganda de uma grande marca. Tal como em 1968, a transformação da revolta em mercadoria domesticada não demorou muito no Brasil de 2013.

 

*O repórter viajou a convite da organização da 11ª CineBH

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