Primeiro longa-metragem da cineasta pernambucana Deby Brennand, o documentário Danado de Bom volta-se para a cultura do próprio estado da diretora. Em uma viagem musical, repleta de depoimentos permeados por estrofes, João Silva, grande parceiro de Luiz Gonzaga, é convidado a retornar às suas raízes nordestinas e recontar sua carreira de sucesso, desde a infância em Arcoverde, pequena cidade a 250 km de Recife.
O passeio nostálgico do compositor pela cidade natal é complementado por entrevistas de alguns de seus contemporâneos do forró, como Dominguinhos e Elba Ramalho, e também por imagens de arquivo de apresentações e antigos bailes nordestinos, salientando a presença de João Silva por trás de momentos marcantes da história do baião no Brasil e imergindo os espectadores na cultura que tanto o inspirou em suas letras.
Através da emoção do letrista ao retornar a Arcoverde, fica evidente o orgulho e o respeito que ele manteve por suas origens. O sotaque, carregado mesmo após muitas viagens por outros estados, encontra-se em alguns momentos com o sotaque da diretora conterrânea. A linguagem, que poderia ser de difícil compreensão para brasileiros de outras regiões, se mostra completamente clara entre eles, mostrando-se parte importante da própria cultura nordestina.
Não é à toa que as letras de João Silva refletem essa preocupação em manter o dialeto sertanejo sempre presente, optando por um discurso informal, repleto de gírias e expressões, ao invés de uma escrita de acordo com o que seria oficialmente o português correto. As rimas, assim, se fazem muito mais espontâneas e divertidas, uma marca do compositor.
Na intenção de possibilitar uma analise mais detalhada de algumas músicas, o documentário insere trechos das letras em forma de texto, como numa espécie de karaokê, mas acaba pecando pela estética das cartelas, excessivamente modernas e gráficas, que destoam da simplicidade e nostalgia presentes no filme.
Essa mistura de formas também prejudica um pouco o roteiro. A opção por mesclar a visita à cidade com diversos outros materiais contribui para um filme biograficamente rico, mas impede que haja um aprofundamento em algum outro tema interessante através da carreira de João Silva, como a própria tradição nordestina presente em Arcoverde. Um enfoque maior no local e em seus habitantes poderia trazer informações autênticas sobre a região que deu origem ao baião, intensificando as lembranças narradas pelo compositor.
Mesmo com alguns problemas de estrutura, Danado de Bom não deixa de ser uma bela homenagem histórica ao trabalho de João Silva. O músico, que durante a filmagem do documentário estava saudável e disposto a compor mais letras, faleceu em 2013 e, infelizmente, não chegou a ver o filme pronto. O documentário cumpre seu papel de registrar a lembrança desse grande artista, junto às músicas que certamente seguirão passando por gerações.
Nota: 6,5/10 (Regular)
* Danado de Bom foi exibido no 21º É Tudo Verdade e venceu o prêmio de melhor filme no 20º Cine PE