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Vasco Pimentel e a descoberta dos sons que não estavam lá

29/10/16 às 10:04 Atualizado em 29/10/16 as 10:14
Vasco Pimentel e a descoberta dos sons que não estavam lá

Por Larissa Figueiredo*, especial para o Cine Festivais

 

Eu estava no segundo ano de estudos de graduação na Haute Ecole d’Art e Design de Genebra, na Suíça, quando fui apresentada ao Vasco Pimentel. Naquela época, esta escola tinha uma capacidade especial de juntar pessoas extraordinárias que tinham como principal objetivo não ensinar, mas fundir cabeças, virar o conceito de realização pelo avesso e tentar fazer com que alguns saíssem dali sem fórmulas, nem teorias, mas com muito desejo.

O realizador português Miguel Gomes atuava como supervisor geral das teses de terceiro ano e trouxe para a escola toda sua equipe; entre eles estava o Rui Poças, diretor de fotografia extraordinário, e o Vasco Pimentel, a quem todos conhecíamos pela cena final de Aquele Querido Mês de Agosto, na qual o diretor se irrita com seu diretor de som, que resolveu abandonar o set e sair em busca de sons alheios à cena que estava sendo rodada naquele instante.

O que poderia ser uma divertida alegoria se revelou extraordinariamente real desde o momento em que cruzei Vasco pela primeira vez nas escadas da escola. Carismático, conquistava a todos desde o primeiro contato, rindo e contando histórias. Ao lhe revelar que era brasileira, trocou logo do francês ao português: “ah, o Glauber… eu era um menino ainda quando estive em um set dele”.

Logo já estávamos todos entregues. Durante uma semana, viajamos juntos por uma história do cinema que começa nos anos 1980 e segue até os mais contemporâneos diretores, contada a partir dos afetos de Vasco. Em algum momento, me solta: “Já viste O Céu de Lisboa, Larissa?” Claro, amo aquele filme, aquela trilha. “Então, eu sou o protagonista. O Wenders se inspirou em mim.”

Tudo com Vasco era assim, uma surpresa atrás da outra, intensas como ele. Nas filmagens era o mesmo; enquanto apontávamos um boom para a cena, orgulhosos de estarmos fazendo um bom trabalho de registro de diálogos, Vasco nos fazia virar o microfone para dentro do oco de uma árvore, mostrando que ali talvez estivessem sons mais interessantes e expressivos narrativamente que na boca dos atores. O objetivo claramente funcionou: saímos dali completamente transtornados, escutando sons que nem sabíamos que existiam.

Anos depois, quando recebi um fundo que me permitiu realizar O Touro, meu primeiro longa-metragem, o Vasco mais uma vez fez uma intervenção rápida e decisiva. Eu precisava entrar em contato com a atriz Joana de Verona, portuguesa, para lhe fazer o convite para ser a protagonista do filme. Comentei com o Vasco sobre este desejo e ele logo se encarregou de escrever à Joana, que me retornou em seguida já aceitando o convite, antes mesmo de saber precisamente do que se tratava o filme: afinal, se era uma indicação do Vasco, não havia dúvidas.

Assim é o Vasco. Um profissional com uma filmografia impressionante, que vai percorrendo o mundo, distribuindo afetos, recolhendo amigos, fundindo cabeças e recomeçando sempre com a mesma energia de um primeiro contato, de um primeiro set, de um primeiro som.

 

*Larissa Figueiredo é cineasta. Dirigiu o longa-metragem O Touro e os curtas O Rei e A Última das Minas (este em codireção com Rafael Urban), entre outros trabalhos.

 

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