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Com filmes atmosféricos, diretora ganha espaço em festivais brasileiros

14/06/15 às 10:15 Atualizado em 21/10/19 as 23:22
Com filmes atmosféricos, diretora ganha espaço em festivais brasileiros

Criada em Campo Grande e radicada em Curitiba, a diretora Nathália Tereza vem ganhando destaque no circuito de festivais brasileiros neste ano. Em janeiro, o seu curta-metragem A Outra Margem competiu na Mostra de Cinema de Tiradentes e obtive boa acolhida da crítica especializada. O seu novo trabalho, A Casa Sem Separação, fará a estreia mundial no 4º Olhar de Cinema – Festival Internacional de Curitiba -, no qual ele faz parte da mostra competitiva de curtas junto com outros oito trabalhos do Brasil e do mundo.

Com inspirações autobiográficas, A Casa Sem Separação foi filmado na mesma casa em que viveu a avó de Nathália, na pequena cidade de Sertaneja, no Paraná. Na trama ficcional, quatro primas vão ao velório da avó e passam a noite dormindo em um carro. Uma delas, Mari, não consegue pegar no sono e decide caminhar pela cidade. Com uma atmosfera muito particular, o trabalho levanta questões sobre a passagem do tempo e o legado familiar.

O Cine Festivais conversou com Nathália Tereza a respeito da sua trajetória no cinema e das particularidades desse seu novo trabalho.

Leia a seguir os principais pontos da entrevista. 

 

Cine Festivais: Como foi o início da sua relação com o cinema? Você fez faculdade na área?

Nathália Tereza: Cresci em Campo Grande. Quando tinha 15 anos, houve um curso de cinema no Museu da Imagem e do Som da cidade. Até então eu só assistia a filmes em casa, mas não via isso como profissão. Depois de fazer esse curso eu me apaixonei completamente pela área, comecei a estudar a respeito e decidi fazer faculdade de Cinema.

Vim para Curitiba fazer o curso da Faculdade de Artes do Paraná, e lá tive contato com várias pessoas que trabalham comigo atualmente. Também foi com elas que montamos a produtora Diadorim Filmes. Então esse período foi algo muito importante para a reunião destas pessoas.

 

CF: Quantos curtas-metragens você realizou antes de A Casa Sem Separação?

NT: Na faculdade eu fiz um curta-metragem chamado Eu, Thereza. Depois demorei para voltar a realizar algo na área, pois acabei indo trabalhar com publicidade, o que foi um erro bem grande.

Minha volta ao cinema foi com o curta Casa de Bonecas. O filme ficou muito ruim, mas foi importante porque foi com ele que descobri como queria trabalhar em termos de produção. Depois filmei Te Extraño, que passou em alguns festivais do ano passado. A gravação de A Casa Sem Separação aconteceu antes da de A Outra Margem, mas como o trabalho não tinha financiamento nós tivemos uma pós-produção mais demorada e ele acabou sendo lançado depois.

 

CF: Considerando estes dois últimos trabalhos lançados este ano (A Outra Margem e A Casa Sem Separação), você vê alguma semelhança entre eles? Procura estabelecer algum caminho próprio em termos de estilo?

NT: Quando fiz Te Extraño comecei a perceber melhor o tipo de narrativa que me interessava mais, que não era aquela com começo, meio e fim bem demarcados. Gosto de começar e terminar meus filmes com os personagens em meio a ações. Mostro pedaços de situações que dizem muito sobre quem são aquelas personagens e quais são os momentos pelos quais elas estão passando.

Acho que faço filmes muito sentimentais. A emoção traz um sentido para eles que não está necessariamente associado a uma lógica de causa e consequência. É como se eu colocasse os personagens em uma trilha e visse até onde eles podem ir.

O que mais tenho tentado desenvolver nos meus últimos filmes é o clima, o tom do trabalho. Talvez seja essa a principal semelhança entre esses curtas, assim como o tempo narrativo. São filmes que dão um espaço maior para o espectador entrar dentro da obra e começar a compreender as situações.

 

A diretora Nathália Tereza

 

CF: Como foi o processo de criação de A Casa Sem Separação? O título surgiu antes ou depois das filmagens?

NT: Tem aquela coisa de que todos os filmes são um pouco autobiográficos. Eu estou desenvolvendo três outros projetos agora, e provavelmente nenhum deles vai ter uma protagonista feminina, como acontece em A Casa Sem Separação.

O filme tem uma premissa mais pessoal, pois a inspiração inicial foi a experiência com o velório da minha avó. A partir disso eu fui ficcionalizando a história até resultar no roteiro. A casa em que filmamos é onde morava a minha avó e fica na cidade de Sertaneja, no interior do Paraná.

Sobre o nome do filme, há uma história bem interessante. Minha avó foi analfabeta durante quase toda a vida, mas depois aprendeu a ler e escrever e resolveu cursar a escola. Ela estava na quarta série quando morreu. Depois disso a gente achou uma tarefa em que a professora pediu para que ela definisse o lugar da casa que ela mais gostava. Em vez de apontar um cômodo, como a sala, ela escreveu quase uma poesia e disse que o que mais gostava era que a casa não tinha separação.

Por isso, quando falo  da casa no título não me refiro a uma estrutura física ou familiar, porque essas são coisas que se separam. Tem muito mais a ver com uma ideia da morte como uma continuação da vida, e não uma oposição.

 

CF: Tem um plano que me pareceu central no seu filme. A câmera, posicionada dentro de um carro, mostra as cadeiras vazias na varanda da casa, como se estivesse mostrando um conflito de gerações, um tempo que passou e que é marcado agora pela morte da avó. Essa questão de discussão temporal era uma das suas preocupações?

NT: Sem dúvida. As cadeiras são muito simbólicas nessas casas do interior. As pessoas sentam ali para conversar no fim da tarde, então elas evidenciam muito a ausência e a presença dos vivos e dos mortos. E o carro, além de elemento de locomoção, é um local fechado, quase como se fosse um caixão. É um momento de imersão muito simbólico. As primas são quase esquecidas durante o velório e tem que dormir ali, ficam entre elas para poder aguentar o que estava acontecendo.

Sobre a questão do tempo, o que é mais marcante é o fato de as personagens em nenhum momento falarem da morte da avó. É como se isso fosse algo não palpável. O filme joga o tempo todo com questões como o claro e o escuro, a luz e a sombra, a vida e a morte.

 

CF: Em A Outra Margem e A Casa Sem Separação o uso da música é responsável por momentos de grande potência cinematográfica. Qual é a sua opinião sobre a relação entre música e cinema?

NT: Isso é engraçado, porque nos meus curtas anteriores eu não usava música, e isso era uma decisão muito firme. Eu achava que a vida é silêncio, e os filmes não poderiam ser diferentes. Acontece que eu amo música, escuto o tempo todo.

Quando fui fazer A Casa Sem Separação pensei em usar uma música que se escutaria na cidade. Depois percebi que essa seria uma escolha muito fácil e decidi usar uma música que tivesse o clima do filme, que fosse da personagem. Para mim, era como se a personagem tivesse entrado em um túnel em que só existe ela mesma. Não há nem o conforto das primas, já que elas dormiram no carro. Queria que a música fosse um fluxo junto com ela, que trouxesse aquela melancolia interna dela para o filme.

Já em A Outra Margem as canções fazem parte do universo do filme, são tocadas pela rádio. As escolhas ali foram por pura simpatia emocional, gosto de todas as músicas que tocam no filme.

 

CF: Quais são as suas principais referências cinematográficas? Há momentos de seu filme, como um longo plano-sequência que mostra apenas os postes de iluminação, com os diálogos acontecendo fora de campo, que me remeteram ao cinema do Antonioni…

NT: Eu aprendi solidão com o (Michelangelo) Antonioni e sobre direção e humanidade com o (Abbas) Kiarostami.

 

CF: Por isso o gosto pelos carros?

NT: Eu tenho o mesmo interesse por carros que o Kiarostami. Acho que é um momento de locomoção em que pessoas estranhas podem estar juntas, elas se olham e não se falam… É muito cinematográfico.

Mas não gosto de ficar presa a referências. Não tento mimetizar planos de outros diretores, nem fico vendo outros filmes durante as gravações dos meus curtas. Acho que é algo que está dentro de mim, e as referências vêm de muitos outros lugares também: da vida, de livros, etc.

 

CF: A Casa Sem Separação fará a estreia mundial no Olhar de Cinema. Como tem sido a sua experiência no festival?

NT: Este é o segundo ano que eu participo, já que no ano passado o Te Extraño passou na mostra Mirada Paranaense. Acho um festival fantástico e estou super feliz de o filme estrear aqui. O Olhar de Cinema se tornou uma janela única dentro de Curitiba para filmes autorais. É importante para os diretores daqui saberem que há esse lugar em que seus filmes podem passar. Isso abre muitas possibilidades.

 

Sessões de A Casa Sem Separação no 4º Olhar de Cinema:

– 15/6, às 19h15, no Shopping Curitiba (Cinesystem – Sala 4)

– 16/6, às 14h45, no Shopping Curitiba (Cinesystem – Sala 4)

 

Leia também:

>>> Cobertura do 4º Olhar de Cinema

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