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Viver é Fácil Com os Olhos Fechados, de David Trueba

23/10/14 às 00:52 Atualizado em 08/10/19 as 20:28
Viver é Fácil Com os Olhos Fechados, de David Trueba

O argumento de Viver é Fácil Com os Olhos Fechados já soa dócil e convidativo à primeira vista. Estamos em 1966, na província espanhola de Almería. Javier Cámara (de Fale com Ela) é Antonio, um professor de inglês fanático pelos Beatles, particularmente por John Lennon, de quem sabe tudo. Ao descobrir que John virá à Espanha para gravar um filme, Antonio não hesita em pegar a estrada rumo ao sonho de encontrar seu ídolo. Logo no início da jornada, conhece Belén (a bela Natalia de Molina), uma garota grávida sem saber para onde ir, e Juanjo (Francesc Colomer), um menino de apenas 16 anos, fugindo de casa após desentendimentos com o pai. Ambos acompanharão Antonio nesse on the road ganhador de seis prêmios Goya (o Oscar espanhol).

A ambientação e alguns braços da trama referenciam Strawberry Fields Forever, canção que John Lennon compôs quando realmente estava em Almería para gravar How I Won the War, de Richard Lester. Autobiográfica, a letra dá conta, metaforicamente, de elementos da infância de Lennon em Liverpool. Viver é Fácil de Olhos Fechados transporta alguns deles para as terras mediterrâneas, como é o caso da plantação de morangos. Além disso, o aspecto onírico da canção rondeia já a premissa do longa, pois dois personagens estão fugindo de problemas da vida real e o outro está tentando algo até então inacessível.

Assim articulado, o movimento de busca espelha um conceito caro a Lennon quando trata da projeção social do sonho, de sua realização em comunhão com os desejos de outrem, ainda que díspares. Belén gosta dos Beatles, mas não morreria por eles, e Juanjo diz prefererir “os Rolling Stones e o The Kinks”. Porém, a eloquente simpatia de Antonio e seu genuíno desejo move montanhas e atrai a torcida inabalável de todos com quem cruza no caminho. O personagem que Javier Cámara nos entrega com maestria tem algo de infantil e um quê melancólico: Antonio não teve filhos, passou a vida lecionando para crianças e agora viaja com dois jovens a fim de encontrar um ídolo da juventude. É inevitável pensar que ele se sinta desencontrado com seu tempo ou com sua idade.

A condição de Antônio é polissêmica e gera uma reação cíclica na psicologia que une os personagens. Ele é romântico com Belén, mas trata Juanjo de maneira paternal. Belén, por sua vez, sente atração por Juanjo, mas lembra a si mesma que está grávida. São configurações que ora gravitam pela tensão do triângulo amoroso, ora se acomodam em um núcleo fraternal, um tanto mais forte.

O diretor David Trueba (de Soldados de Salamina) é clássico, filma com elegância, deixa a câmera se servir do carisma de Javier e seu roteiro dá o flow que pede o on the road, aqui luxuosamente embalado pelo violão de Pat Metheny (Goya de Melhor Trilha Sonora). Almería é um pouco “californiana” e nos presenteia com estradas repletas de curvas sinuosas e contornos esmaecendo no horizonte. Se o desenvolvimento da trama talvez seja previsível demais ou careça de fôlego criativo, o filme é bem-sucedido na sua intenção de nos trazer um pouco de ternura e nostalgia.

Nota: 7,0/10 (Bom)

 

* Filme visto na 38ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo

 

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