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Tudo por Amor ao Cinema, de Aurélio Michiles

30/05/14 às 13:50 Atualizado em 20/11/19 as 15:23
Tudo por Amor ao Cinema, de Aurélio Michiles

A trajetória de Cosme Alves Netto (1937-1996) se confunde com a história da luta pela preservação da memória cinematográfica brasileira. Diretor da Cinemateca do MAM-RJ por mais de duas décadas, ele é o personagem principal do documentário Tudo por Amor ao Cinema, de Aurélio Michiles, que foi exibido na abertura da 9ª CineOP – Mostra de Cinema de Ouro Preto.

Para um filme que, como o próprio título diz, trata de uma pessoa apaixonada por cinema e, especialmente, pela memória cinematográfica, a projeção da obra em um local como o cinquentenário Cine Vila Rica, em um evento que tem como foco justamente o tema que guiou a atividade profissional de Cosme, veio bem a calhar.

Amazonense de família abastada que veio ao Rio de Janeiro ainda jovem, Cosme admitia que, como cinéfilo, a sua primeira intenção no sentido de preservação dos filmes era individualista: queria saber onde teriam ido parar as obras a que assistia durante a infância. Ao tentar descobrir como os filmes “nascem e morrem”, Cosme acabou encontrando uma atividade bem menos egocêntrica, buscando a conservação, a restauração e a difusão de filmes de todas as épocas, que para ele nada mais eram que documentos históricos de grande valor que deveriam estar à disposição da sociedade.

Para falar de um grande cinéfilo como Cosme, o diretor Aurélio Michiles utiliza fragmentos de filmes clássicos. Quando uma entrevistada diz algo sobre o Aterro do Flamengo, aparecem imagens de Limite, de Mário Peixoto; no momento em que é contada uma passagem na qual Cosme desiste de fazer uma viagem, é mostrado um trecho de Pickpocket, de Robert Bresson; e assim por diante. Este recurso é utilizado de modo orgânico à narrativa e, além de atestar a riqueza de elementos e significados que um filme pode ter, ele serve como chamariz para que os fãs de cinema busquem identificar as obras citadas.

Exibindo um bom acervo audiovisual de entrevistas de Cosme Alves Netto, o documentário acaba, indiretamente, reafirmando o valor que o seu personagem principal dava às imagens. Além desse recurso e dos fragmentos de filmes, também são mostradas entrevistas com diversas pessoas que conheceram Cosme de alguma maneira e ajudam a contar a sua trajetória da adolescência até a morte, ocorrida em 1996.

Duas facetas de Cosme são bem enfocadas pelo documentário: o papel de agente político que mesmo perseguido e preso durante a Ditadura Militar em duas oportunidades deu continuidade à “subversiva” atividade de preservação de filmes; e a habilidade para incentivar cineastas que tiveram obras censuradas pelo regime – Blá-blá-blá, de Andrea Tonacci, foi levado clandestinamente por Cosme para um festival europeu, e as filmagens dos anos 60 de Cabra Marcado para Morrer, de Eduardo Coutinho, foram preservadas sob o nome fictício de Rosa do Campo.

Em seu começo e final, o documentário de Michiles ainda tangencia o panorama cinematográfico atual. Ao mostrar DVDs piratas a serem vendidos na rua e um protesto a favor da reabertura do Cine Belas Artes em São Paulo, a obra traz à tona, por um lado, a revolução que a tecnologia digital trouxe para todas as áreas do cinema (conservação, restauração, exibição) e, por outro, o fim gradual dos cinemas de rua e a necessidade de uma resistência cinéfila diante de interesses que visam soterrar a importância cultural cinematográfica.

São assuntos complexos, que poderiam ser objeto de estudo de um outro filme, e por isso mesmo são apenas sugeridos no documentário. Apesar de não sabermos para onde a sétima arte caminhará, Tudo por Amor ao Cinema tem o mérito de mostrar que nenhuma trajetória será válida sem o amor que Cosme Alves Netto demonstrava pelos filmes.

*Filme visto na 9ª CineOP – Mostra de Cinema de Ouro Preto

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