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Repulsa, de Eduardo Morotó

22/01/18 às 11:36 Atualizado em 08/10/19 as 20:24
Repulsa, de Eduardo Morotó

Retomar processos históricos usando o cinema como método implica sempre um perigo latente: ser um filme que caminha para atender expectativas prévias, num processo que visa muito mais investigar suas próprias certezas, afirmando-as como postulados, do que investigar quais as possibilidades de trajetória daquelas relações históricas.

Repulsa, filme rodado em película no interior de Pernambuco, investe suas atenções na tentativa de, reconhecendo a corrupção e os abusos de poder como manifestações endêmicas do Brasil, retomar um passado de modo a estendê-lo no presente, sendo assim passado e presente réplicas um do outro. Aqui temos parte do problema. Digo “parte” porque a relação entre passado e presente seria promissora fosse conduzida com menos paixão pela suposta catarse a ser causada na platéia.

Sobre esse aspecto, é importante pontuar que a gênese do Brasil está nas relações de poder organizadas no signo da violência, por isso justamente é preciso mais cuidado ao tratar de tais relações, tendo em vista as variantes que evitem quedas na quase fábula de uma ruína moral incurável que nos atinge. A violência e a corrupção no Brasil são ferramentas de manutenção econômica antes de serem manifestações de um desvio moral crônico. O senhor de engenho, o coronel e os capatazes não são psicopatas, e é justamente essa a grande perversidade da história brasileira.

Há outra discussão gerada por Repulsa: quando mostrar ou não a violência? Há dois cortes fundamentais nos 20 minutos de projeção que parecem mais um recuo do que um gesto de decisão, e que por fim acabam atenuando a natureza da violência naquele espaço. A seqüência da invasão à casa antecipa seus acontecimentos, e por isso perde força. E o último plano, em que Carolina surge à mercê dos homens, é problemático sobretudo pela maneira como o corpo da jovem surge emoldurado em cena, retrato de um olhar bastante masculinizado sobre o trauma vivido pela jovem.

A questão é que o filme de Eduardo Morotó tem tamanha convicção sobre as relações históricas que observa a ponto de sequer desenvolvê-las com lucidez. A retomada histórica aqui é quase como uma daquelas listagens por tópicos: o coronel explora, as famílias pobres são chacinadas, as instituições são corruptíveis, o processo se repete. O que seria ponto de partida vira ponto de chegada, e é nesse movimento que o filme se perde.  A história brasileira precisa ser investigada, mas antes é preciso superar esse fetiche pela catarse, esse tesão por gritar “Fora” sem sequer estar verdadeiramente dentro.

 

*Filme visto na 21ª Mostra de Tiradentes

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