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O Futebol, de Sérgio Oksman

12/04/16 às 17:16 Atualizado em 08/10/19 as 20:26
O Futebol, de Sérgio Oksman

É comum o uso de grandes eventos esportivos para a promoção de reconciliações históricas. Nas Olimpíadas de Sidney, em 2000, a medalha conquistada pela corredora Cathy Freeman simbolizava uma união entre brancos e aborígenes na Austrália. Na Copa do Mundo de 2006, muitos alemães se sentiram pela primeira vez à vontade para cantar o hino a plenos pulmões e celebrar o nacionalismo depois das profundas marcas deixadas pelo nazismo.

Em O Futebol, Sérgio Oksman traz essa ideia global para o seu universo particular. Em 2013, o brasileiro radicado na Espanha voltou ao seu país natal e reviu o pai, Simão, com quem não tinha contato há mais de 20 anos. Como narrado na primeira cena, Sérgio tem a ideia de estreitar os laços familiares ao voltar ao Brasil um ano depois, durante o período da Copa do Mundo, e é essa nova reunião da dupla que acompanhamos ao longo da projeção.

Como o reencontro já aconteceu, a urgência e a imprevisibilidade de situações como essa não são o foco do filme. Abrindo mão da estética da câmera na mão geralmente associada ao gênero documental, a proposta de Sérgio Oksman é realizar um filme extremamente planejado, com enquadramentos bem pensados e planos longos e fixos.

Esta intenção inclui a relação de Sérgio e Simão em frente às câmeras. Além do diretor, o pai também tem clara a noção de que está participando de um filme, mesmo que representando o seu papel. Isso fica explicitado na cena em que Simão, filmado dentro de um botequim, pergunta: “Sérgio, já posso ir embora?”.

Em uma primeira camada, há uma busca pela construção de um cenário entediante. A São Paulo retratada surge deserta, sem a glamorização das transmissões de TV; os jogos, quando exibidos, aparecem sempre como pano de fundo em algum bar; o pai é mostrado como um devotado ao trabalho que, mesmo diante das insistentes tentativas do filho, sequer cogita suspender a labuta para acompanhar in loco a algum jogo da Copa.

A cena que mais simboliza a proposta do filme é aquela em que pai e filho vão até o entorno da Arena Corinthians durante o jogo Bélgica e Coreia do Sul e acompanham a partida de dentro do carro, sem sequer uma transmissão radiofônica para guiá-los. Assim, Sérgio e Simão escutam os ruídos dos torcedores e tentam adivinhar o que está acontecendo dentro do campo de jogo.

O Futebol é um filme em que o não visível e, principalmente, o não dito, exerce influência vital. Das conversas entre pai e filho é possível apreender algumas informações objetivas sobre aquela história (o fato de o pai ter morado por 14 anos em um hotel, por exemplo), mas o que há de mais interessante está no choque de expectativas (Sérgio pensando que o pai tinha a voz de um locutor esportivo) e na negação do confronto com o passado (Simão encarando as imagens antigas de seu casamento com pouco interesse).

A escolha por centrar grande parte do filme em cenas no carro, com a câmera filmando do banco de trás, pode trazer muitas interpretações. O recurso serve como uma espécie de negação de um lar comum para aquelas pessoas, sempre em movimento. Há também um simbolismo na condução do carro por Simão, que se nega a ter um papel passivo nas filmagens.

O principal mérito de Sérgio Oksman é ficar sempre aberto às brechas do cotidiano, estando elas sob o seu controle ou não. O futebol aqui é apenas o assunto possível para a criação de um contato superficial, sem que mágoas ou outra gama de sentimentos venham à tona.

Simão se esforça para criar a imagem de profundo conhecedor de futebol, inclusive se colocando à disposição para um duelo com qualquer pessoa que ache que entenda mais da história do esporte que ele. Um tempo depois, no mesmo lugar, ele resmunga para o filho, diz que “vai acertar” alguma coisa, cita um neto.

Os resmungos – ou a enigmática pilha de cadernos de palavra cruzada colecionados por Simão – são a essência desse belo trabalho sobre a incomunicabilidade.

Nota: 8,0/10 (Ótimo)

 

Sessões de O Futebol no 21º É Tudo Verdade:

– 13/4 – 21h – Cinearte (São Paulo)

– 14/4 – 13h – Cinearte (São Paulo)

– 15/4 – 21h – Espaço Itaú Botafogo – Sala 6 (Rio de Janeiro)

– 16/4 – 13h – Espaço Itaú Botafogo – Sala 6 (Rio de Janeiro)

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