facebook instagram twitter search menu youtube envelope share-alt bubble chevron-down chevron-up link close dots right left arrow-down whatsapp back

E, de Alexandre Wahrhaftig, Helena Ungaretti e Miguel Antunes Ramos

25/08/14 às 15:31 Atualizado em 08/10/19 as 20:29
E, de Alexandre Wahrhaftig, Helena Ungaretti e Miguel Antunes Ramos

 

Texto de Thiago Zygband, do Crítica Curta*

 

São Paulo movimenta-se em tédio. Mitose da compulsão e da rotina, carros, monocromia, prédios, gentrificação e a expansão irracional de certa lógica perversa. Diz-se que a cidade não para, a cidade só cresce. Serão os deuses testemunhas? Se parece inelutável o destino, ao menos fazemos cinema.

E, dos diretores Alexandre Wahrhaftig, Helena Ungaretti e Miguel Antunes Ramos, é uma interessante perspectiva sobre tais fatos. O documentário vai ao cerne da autorreplicação e do aparente nonsense da metrópole bandeirante ao analisar uma de suas mais gritantes manifestações: os estacionamentos. Crescem em vertigem esses espaços silenciosos, mas que não surgem do nada – os depoimentos colhidos nos lembram que aqueles lugares também têm história e afetos: um era (saudoso) cinema-de-bairro, outro a casa do papai, um terceiro a da vovó, um quarto, um quinto…

O documentário assume ares de ficção científica. São estranhas as máquinas. Abstratas, têm apelo estético e parecem existir por si próprias – de fato, não há imagem humana nítida no filme. O movimento está restrito aos guindastes, carros, catracas e, nos prédios das classes abastadas, até aos próprios estacionamentos-elevadores. “Privacidade, exclusividade, […] morar bem”, depõe uma moradora. Podemos ver suas mãos que saem de dentro de um enorme carro: o único pedaço de carne do curta.

O proprietário de estacionamento nos confessa: “Investimento pequeno, rentabilidade pequena também […] não é um grande negócio”. Nesse caso, sua serventia é apenas a ocupação do espaço; logo erguerá um prédio, grande negócio, por suposto. Assim rumamos aos céus. Eram sete pequenas casas, logo serão a concretização de uma maquete pomposa em regalias contemporâneas – elevador de automóveis, parque privativo, vigilância 24 horas e outras liberdades do espaço privado, sonhos em metros quadrados que o dinheiro pode comprar.

E são através das fotografias de satélites retiradas do Google que recordamos como eram as tais falecidas casas. Note-se: especulação imobiliária nas ruas, informação-mercadoria no mundo virtual. Também são privadas as imagens do espaço público da cidade, e por ela só se flana enquanto potencial consumidor dos anúncios que pululam no canto da tela. Logo se atualizarão as fotografias, e aquilo será somente o eterno-presente da Internet.

Em Pequena História da Fotografia, Walter Benjamin, sobre o trabalho do fotógrafo Atget na Paris do século XIX, indica que aquelas imagens privadas de corpos humanos, nas quais captou construções solitárias e indiferentes típicas da vida moderna, parecem esconder a evidência de um crime. Da mesma forma, a São Paulo esvaziada de E é como casa que não encontrou moradores, uma cidade que parece prescindir o mundo dos humanos. Onírica, surreal, espetáculo da ausência e do vazio, infinitamente cinza e melancólica. E tão estranhamente suspeita…

 

E está no Panorama Paulista 4. Clique aqui e veja a programação do filme no 25º Festival Internacional de Curtas-Metragens de São Paulo.

 

*Crítica Curta é um projeto da Associação Cultural Kinoforum que acontece anualmente no Festival Internacional de Curtas-Metragens de São Paulo. Desde 2005, o projeto convida estudantes de escolas de audiovisual parceiras do Festival para refletir sobre o curta-metragem e escrever a respeito. Os alunos assistem aos filmes dos programas brasileiros e produzem textos críticos, sob orientação do crítico de cinema Heitor Augusto.

Em parceria com a 25ª edição do evento, o Cine Festivais publica alguns dos textos produzidos pelo Crítica Curta. Para saber mais sobre o projeto, acesse a sua página oficial.

 

Leia também:

>>> Entrevista com o diretor Miguel Antunes Ramos sobre E

>>> Filme crítico a Eduardo Campos ganha novos significados com morte do político 

>>> Curta revive lendas urbanas de favela carioca

>>> Cobertura completa do Festival de Curtas de São Paulo

Entre em contato

Assinar

Siga no Cine Festivais