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Aracati, de Aline Portugal e Julia de Simone

29/01/16 às 11:03 Atualizado em 08/10/19 as 20:26
Aracati, de Aline Portugal e Julia de Simone

Entre os moradores do Vale do Jaguaribe, no Ceará, a passagem diária do vento Aracati é tida como uma certeza. Ao mesmo tempo em que se expressa como um agente intangível e atemporal, essa corrente de ar é testemunha e uma das causas das transformações naturais e sociais da região, como mostra o documentário de Aline Portugal e Julia de Simone.

A noção do vento como fio condutor do filme é construída nos primeiros momentos em cenas que destacam a grandiosidade da natureza e das máquinas que trabalham para aproveitar a sua força, como no plano em que uma hélice usada para captar energia eólica é lentamente deslocada. Pelo modo lateral com que a câmera capta o momento, por alguns instantes é possível crer que aquele objeto é um foguete, e que haverá ali uma guinada para a ficção científica.

Tal estranhamento é gerado, sobretudo, pelo modo com que as diretoras evitam filmar frontalmente os rostos das pessoas nesses primeiros momentos do filme – um motoqueiro é visto com capacete, uma mulher com seu filho é vista primeiro de longe, em um plano aberto, e depois de costas, com o rio à sua frente.

Embora sejam coisas fluidas e coexistentes, é possível apontar uma passagem de um foco macro (a imensidão da natureza e da tecnologia) para um micro (as subjetividades dos moradores do local) ao longo da projeção. Tal movimento ganha maior notoriedade na cena em que um cavaleiro se “intromete” em um plano que retratava a paisagem local, primeiro apenas através do áudio, depois no primeiro plano em que efetivamente se dá um retrato frontal dos personagens do longa.

Os encontros da equipe com essas pessoas trazem alguns achados que enaltecem a noção de transitoriedade que o filme quer ressaltar, como no momento em que um homem que caminha ao lado do açude que inundou uma antiga cidade encontra uma velha mala enterrada no local.

Complementarmente, a presença de um senhor que levanta questões metafísicas (como saber se o Big Bang realmente existiu?) e até mesmo metalinguísticas (se alguém está filmando, isso deve ter a sua importância) de um modo extremamente simples, mas não menos sofisticado, é a chave para adentrar a uma concepção de mundo que tende a se esvair aos poucos.

É na tentativa de expandir de alguma forma o tempo (fílmico/”real”) que o documentário desvia a sua rota para seguir de perto este personagem por alguns instantes, embora não perca de vista que, seja pela imponência da tecnologia ou pela nossa pequenez diante do universo, o tempo é um moinho de vento que nunca para de rodar.

Nota: 7,5/10 (Bom)

 

*Filme visto na 19ª Mostra de Cinema de Tiradentes

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