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A Teoria de Tudo, de James Marsh

30/01/15 às 03:10 Atualizado em 08/10/19 as 20:28
A Teoria de Tudo, de James Marsh

São dois os aspectos que, unidos, tornam a figura de Stephen Hawking emblemática: a genialidade e a condição física. O cosmólogo britânico se tornou célebre por sua incursão no ambicioso campo da Física Teórica. O início do universo, a conexão entre a química quântica e a relatividade geral de Einstein ou a questão do espaço-tempo são alguns dos objetos de sua icônica obra. Também contribuiu para torná-lo mítico na cultura pop o fato de Hawking ser portador da esclerose lateral amiotrófica (ELA), doença que destrói em cascata os neurônios motores. Tema recente de campanhas de arrecadação, como o desafio do balde de gelo, a moléstia acometeu Hawking aos 21 anos e condicionou a imagem do teórico à cadeira de rodas hiperequipada e ao sistema digital que emite suas falas.

A Teoria de Tudo, de James Marsh, acrescenta um terceiro pilar a essa construção: o amor entre Hawking e Jane, sua primeira esposa, com quem seria casado por 26 anos. O roteiro de Anthony McCarten se baseia no livro Travelling to Infinity: My Life with Stephen, em que a própria Jane narra uma cronologia da vida do casal.

Das três dimensões, o lado cientista é o mais frágil do filme. O documentarista James Marsh, dos ótimos Projeto Nim e O Equilibrista, não encontrou expressão cinematográfica minimamente inspirada para apresentar a performance de Hawking no campo das ideias. A genialidade do físico foi relegada a pensamentos genéricos e a um desfile de clichês na reconstrução de possíveis epifanias e do ambiente acadêmico em Cambridge.

A condição especial de Hawking ganhou melhor abordagem. Uma doença que leva o corpo humano ao extremo, limita interações e altera drasticamente a maneira como se percebe a vida é mote comum no cinema. No melhor dos mundos, serviu à radicalização da forma, como fez Julian Schnabel na obra-prima O Escafandro e a Borboleta. Em A Teoria de Tudo, a abordagem é mais convencional e um tanto sentimentaloide, mas se salva por contar com uma interpretação maiúscula.

Um dos favoritos ao Oscar de melhor ator, Eddie Redmayne, de Sete Dias com Marilyn e Os Miseráveis, honrou a cartilha das premiações americanas e desfigurou-se por completo, em performance corporal que vai, gradativamente, entortando articulações e paralisando músculos, no ilustrar da potência degenerativa da esclerose. Ao retratar os estágios mais severos da doença, Redmayne precisa lidar com uma progressiva limitação instrumental, sobrando-lhe os olhos e poucos movimentos faciais. Mesmo assim, o jovem ator confere alguma ternura a Hawking, também representado como um homem travesso e bem-humorado.

O roteiro, no entanto, tira substância do personagem ao ignorar facetas conhecidas do físico inglês, como a vaidade, por exemplo. O problema aqui não é o intuito hagiográfico ou apologético, também presente no livro de Jane Hawking, mas o quanto a opção superficializa Hawking. O predomínio, em parte imperativo, dos efeitos da condição física do cientista – reiterados em diversas cenas com essa única função – gera compaixão, mas diminui sua personalidade.

O desempenho do casal protagonista é a melhor coisa de A Teoria de Tudo

O desempenho do casal protagonista é a melhor coisa de A Teoria de Tudo

Resta, então, a sintonia entre o casal como a grande qualidade do filme. Felicity Jones, de Like Crazy, tem em Jane Hawking a personagem mais interessante do longa. Apaixonada, Jane encara a missão hercúlea de cuidar do cientista e de seus filhos (o casal teria três no total) sem qualquer ajuda profissional. Por vezes a nobre entrega se revela um fardo e Jane se enfurece, perde a paciência. A chegada de Jonathan (Charlie Cox) na vida do casal terá caráter ambíguo: é um homem com uma disposição quase celestial para ajudar Jane com todos os afazeres, mas nascerá entre eles um sentimento mais forte, à sombra de Hawking e sua doença. Felicity, também lembrada nas premiações, é adepta de um acting mais discreto, com gestos contidos e bem calculados. É assim que dá humanidade a uma personagem mais complexa do que a sinopse faz crer.

No mais, o refinamento das academias britânicas de arte dramática e a tradição do teatro londrino garantem a qualidade do elenco de apoio. David Thewlis, Maxine Peake e Emily Watson são presenças constantes nas boas produções inglesas. Um nome em ascensão que deve garantir prêmios à produção é o do islandês Jóhann Jóhannsson, eclético compositor que aqui mostra bela peça sinfônica na trilha, menos experimental do que sua obra recente, mas com os traços melancólicos que já o caracterizam.

Nota: 6,0/10 (Regular)

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