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A Morte Diária, de Daniel Lentini

17/10/15 às 01:21 Atualizado em 08/10/19 as 20:27
A Morte Diária, de Daniel Lentini

Nove entre dez artistas que já retrataram a passagem do tempo concordariam que eis aí um fenômeno melancólico. Não somos perturbados apenas pelos valores contemporâneos, que dão à juventude e ao “novo” o altar do tempo presente, mas também pela inconveniência da memória: lembramos do que já fomos. A complexidade do desafio de traduzir “o que já não é” suscita o interesse pelas soluções poéticas de Daniel Lentini no documentário A Morte Diária.

Natural de Varginha (Minas Gerais), Daniel volta à cidade para filmar a transformação a que o lugar foi submetido. Usa, para isso, o recurso do catálogo, registrando múltiplos exemplos de coisas (e pessoas) que estão morrendo, definhando, degradando, ou apenas dando lugar a outros elementos – notadamente uma urbanização quebrada e caótica.

Parte da tristeza contida num período transitório vem do abalo da identidade. Um lugar, até virar outro, torna-se um “não lugar”. E as linhas demarcatórias dessas etapas são indefinidas, o que aflige o espaço do afeto. Para usar um exemplo conservador (no melhor sentido do termo), a clássica imagem da casa da avó no almoço de domingo nos acostuma a uma configuração e é natural que voltemos para usufruir daquilo que “sabemos que estará lá”. As recordações funcionam em dinâmica semelhante: gostaríamos que os lugares mais importantes da nossa infância nunca se transformassem. Trata-se de um apego que reside na imobilidade. É isso que se perde no retorno de Daniel ao sul de Minas.

Talvez a maior riqueza do documentário esteja no plano das associações poéticas. Daniel não cede ao expediente comum no cinema brasileiro atual de fazer panfletagem contra a especulação imobiliária. Prefere criar imagens sugestivas das conurbações conceituais e físicas em andamento. Quando filma, em plano estático, um idoso em frente a uma casa desgastada, ambos inclinados nas ladeiras íngremes, acaba sobrepondo ruínas e criando um quadro tenso e soturno sobre a implacabilidade do tempo.

Nota: 8,5/10 (Ótimo)

 

>>> Acompanhe a cobertura da 9ª CineBH

 

* Filme visto na 9ª CineBH – Mostra Internacional de Cinema de Belo Horizonte

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