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Conheça a trajetória da Vermelho Profundo, homenageada na 9ª CineBH

14/10/15 às 18:36 Atualizado em 20/11/19 as 15:09
Conheça a trajetória da Vermelho Profundo, homenageada na 9ª CineBH

Mais do que pelo local com pouca tradição cinematográfica em que está sediada (Campina Grande, interior da Paraíba), a produtora Vermelho Profundo vem chamando a atenção da curadoria de muitos festivais brasileiros graças ao modo singular com que seus diretores lidam com os filmes de gênero, algo não tão comum no Brasil.

Western (Mais Denso que Sangue), ficção científica (O Hóspede), horror (O Desejo do Morto) e thriller (Cova Aberta) estão presentes na filmografia da produtora, que vai ter seis de seus curtas-metragens exibidos em uma retrospectiva organizada pela 9ª CineBH – Mostra Internacional de Cinema de Belo Horizonte – nos dias 17 e 18 de outubro (sábado e domingo), no Cine 104.

“Nossos filmes são sempre meio esquisitos; um faroeste como Mais Denso que Sangue tem motos, Jesus Cristo e uma encenação da Semana Santa no interior da Paraíba, por exemplo. As coisas estão sempre um pouco deslocadas, utilizadas em um outro contexto, mas eu acredito que ainda assim nossos trabalhos são faroestes, filmes de horror, ficções científicas…”, aponta Ramon Porto Mota, sócio da Vermelho Profundo ao lado de Ian Abé, Jhésus Tribuzi e Fabiano Raposo.

Em entrevista ao Cine Festivais, Ramon falou sobre o crescimento da produção cinematográfica na Paraíba, relembrou a trajetória da produtora Vermelho Profundo, comentou sobre a homenagem precoce à produtora – que ainda prepara seu primeiro longa-metragem – e analisou o crescimento atual do horror no cinema brasileiro.

 

Cine Festivais: O atual momento da produção cinematográfica paraibana é o melhor da história?

Ramon Porto Mota: Pela primeira vez a Paraíba vem tendo uma continuidade em festivais relevantes no Brasil, ao menos nos curtas-metragens. O estado sempre teve uma produção muito pequena, que era focada em documentários, e agora passamos a produzir mais e a realizar principalmente ficções. Acho que o investimento por parte do governo local na produção foi o que começou a viabilizar este momento.

O cinema paraibano teve quatro filmes na competição do último Festival Internacional de Curtas de São Paulo, o que eu acho uma coisa incrível. A produção aqui está se estabilizando, mas eu acho que isso é um reflexo do país inteiro, de um movimento de descentralização que vai além do eixo Rio-São Paulo.

Se tudo sair como prometido, o governo da Paraíba vai dar aporte para a produção de quatro longas-metragens locais, sendo que um deles será produzido pela Vermelho Profundo e eu irei dirigir.

É um momento em que o cinema paraibano pode se tornar alguma coisa de fato, ter uma relevância nacional maior do que simplesmente em um ou outro festival com curtas-metragens.

 

CF: A produção de longas-metragens na Paraíba é rara?

RM: A produção de longas-metragens sempre foi muito rara na Paraíba. Houve o documentário O País de São Saruê, de Vladimir Carvalho, nos anos 70, depois teve um filme de Vânia Perazzo, chamado Por 30 Dinheiros, que circulou muito pouco. E mais recentemente foi lançado Batguano, de Tavinho Teixeira, que fez carreira em festivais brasileiros e teve uma recepção da crítica muito boa.

Com esse edital regional estão previstos quatro longas, incluindo um do Tavinho. Do ponto de vista histórico, essa é a primeira pedra para o surgimento de uma cinematografia de fato, que não seja uma coisa esporádica. Nos próximos dois anos, teremos no mínimo quatro longas-metragens de ficção paraibanos, além de alguns documentários que eu sei que estão sendo produzidos. Estamos vivendo o momento antes da aurora do cinema paraibano, do surgimento de uma produção que possa dar uma cara e um corpo para ser percebido fora do estado.

 

CF: Qual foi a sua trajetória para chegar a ser cineasta e como surgiu a ideia para a criação da produtora?

RM: Sou desses que começou a fazer cinema porque assistia a muitos filmes, e essa é mais ou menos a história dos meus sócios na produtora (Ian Abé, Jhésus Tribuzi e Fabiano Raposo). Eu sou formado em História e eles fizeram Arte e Mídia, um curso que tem a ver com cinema e audiovisual, mas não é exatamente sobre isso.

A Vermelho Profundo surgiu há dois anos como um reflexo de a produção de curtas da gente estar dando certo. Os filmes foram tendo uma espécie de respaldo dos festivais – essa retrospectiva na CineBH meio que prova isso. O nosso intuito sempre foi o de seguir tocando e ampliando nossos projetos.

 

CF: O trabalho com o cinema de gênero sempre foi a ideia de vocês?

RM: A empresa tem uma cara muito ligada a essa ideia de cinema de gênero. Todos nossos filmes lidam com isso, seja com thriller, ficção científica, western ou horror. O gosto por esse tipo de filmes acaba tendo um reflexo em nossa produção.

Nossos filmes são sempre meio esquisitos; um faroeste como Mais Denso que Sangue tem motos, Jesus Cristo e uma encenação da Semana Santa no interior da Paraíba, por exemplo. As coisas estão sempre um pouco deslocadas, utilizadas em um outro contexto, mas eu acredito que ainda assim nossos trabalhos são faroestes, filmes de horror, ficções científicas, etc.

 

Assista acima ao curta-metragem Mais Denso que Sangue, de Ian Abé

 

CF: Quais são as principais referências cinematográficas de você e dos outros sócios da produtora?

RM: Algumas referências são óbvias. Nosso nome, Vermelho Profundo, foi “roubado” de um filme do Dario Argento, Profondo Rosso, que para mim é uma das maiores obras-primas da história do cinema.

Gostamos muito de Lucio Fulci, Mario Bava e de todo horror americano dos anos 70, com nomes como Wes Craven, John Carpenter, Tob Hooper. Eu acho que não existe nada tão incrível no cinema moderno quanto esse movimento de horror que surge com Noite dos Mortos-Vivos (de George Romero) e vai até Sexta-Feira 13 (de Sean S. Cunningham).

Eu me tornei cinéfilo de horror e de filmes de gênero tardiamente. Comecei assistindo Eric Rohmer, Godard, e eles também fazem parte da minha cinefilia. Costumo dizer que a gente ama tanto True Lies quanto Pickpocket, vamos de James Cameron a Bresson com muito carinho por todos eles.

 

CF: Quais foram os principais festivais que destacaram o trabalho da Vermelho Profundo?

RM: Acho que a Mostra de Tiradentes foi quem de fato abriu as portas para a gente. Os primeiros filmes da Vermelho Profundo estrearam lá ou em Ouro Preto – CineOP, no caso de Mais Denso que Sangue. O Desejo do Morto acabou não passando por que era mais longo e não podia nem ser inscrito, mas depois ele foi exibido na CineBH.

Esses festivais da Universo Produção (Mostra de Tiradentes, Mostra de Ouro Preto e CineBH) gostam muito da gente, mas nossos filmes também foram exibidos no Festival Internacional de Curtas de São Paulo, no Festival de Curtas de Belo Horizonte, no Curta Cinema, no Rio de Janeiro. Nesses festivais um tanto quanto alternativos, fora do grande eixo formado por Gramado e Brasília, a Vermelho Profundo alcançou um lugar, e acho que isso ocorreu porque é justamente nesses lugares que as pessoas têm uma visão mais aberta do que pode ser o cinema brasileiro.

 

CF: O que representa essa retrospectiva precoce realizada pela CineBH?

RM: Além do aspecto pessoal, eu acho incrível que a CineBH tenha escolhido a Vermelho Profundo para essa retrospectiva porque é uma escolha nada óbvia, e o cinema brasileiro está em um momento de busca por outras possibilidades de cinema, menos esquemáticas ou centralizadas. A onda do cinema pernambucano mostra que há uma vontade de abrir as portas para a produção do resto do país, e a Vermelho Profundo acaba aparecendo por causa disso também.

 

CF: Os trabalhos de vocês me parecem ter uma veia popular, no sentido de serem mais facilmente identificáveis com o gosto de um público mais amplo…

RM: Sempre quisemos fazer filmes que não fossem “cabeçudos”, que buscassem um contato direto com o público. O (diretor) William Friedkin escreveu na sua autobiografia que faz filmes buscando exhilaration (euforia), uma espécie de impacto direto no publico. Isso sempre foi uma coisa que a gente quis ter nos nossos filmes.

Acho que não é comum nesse tipo de cinema brasileiro mais fora do mainstream um olhar mais atento para o cinema americano, e não para o cinema europeu, falando de forma bem genérica. Mesmo o terror italiano dos anos 70, que é uma referência para nós, é altamente conectado com o cinema americano.

 

CF: O fato de a CineBH abranger filmes de todo o mundo, sem um recorte apenas autoral, faz com que ela seja um espaço interessante para os filmes de vocês?

RM: Eu nunca estive antes na CineBH, embora meu curta O Desejo do Morto tenha sido exibido lá. Acho incrível que se busque quebrar as barreiras de um público arthouse, essa coisa meio Reserva Cultural (cinema de arte de São Paulo). Eu sempre quis que as pessoas reagissem aos meus filmes; Uma das coisas que me deixaram mais feliz foi quando O Hóspede passou em um festival realizado em várias cidades do interior do Piauí e ganhou o prêmio do público. Achei isso incrível.

O Brasil tem uma população muito grande, que deseja se identificar e se ver na tela. Isso não costuma acontecer no cinema ou na TV com as regiões fora do Sul e Sudeste. Quando aparece nordestino na Globo é a Susana Vieira fazendo aquele sotaque horroroso que virou motivo de chacota no Nordeste.

Sempre fico me perguntando como é Porto Velho ou Macapá no cinema. Temos muitos lugares no País que não são explorados audiovisualmente, e as pessoas anseiam por se ver na tela. Acho que uma prova disso foi o sucesso de público que o Cine Holliúdy, do Halder Gomes, conseguiu.

Mas aí o que vamos ter agora é Reza a Lenda, com o Cauã Reymond fingindo ser um cara do interior da Bahia. Não sei se o filme é bom ou ruim, não é essa a questão. A gente está em 2015 e ainda colocam o Humberto Martins para fazer um coronel baiano. É um processo meio viciado, e acho que discutir essa questão de como ser popular no cinema brasileiro passa por isso.

 

CF: Qual é a sua opinião sobre o crescimento da produção brasileira de filmes de horror?

RM: Está havendo no mundo inteiro uma nova percepção sobre o lugar do cinema de horror, como provam filmes como A Bruxa, que venceu o prêmio de melhor direção no Festival de Sundance, e Corrente do Mal. Acho que o cinema brasileiro está atrasado em relação a esse momento.

O desejo de criar esse cinema aqui existe desde 1964, quando o José Mojica Marins fez À Meia-Noite Levarei Sua Alma, que para mim é um filme absolutamente incrível e genial do cinema brasileiro. Essa foi a pedra fundamental, para a qual todos nós olhamos.

Esse cinema sempre quis sair; estava ali, como um bom monstro de filme de horror, esperando a oportunidade para isso. As pessoas agora estão achando esse monstro do cinema de horror brasileiro legal, ele já não é tão asqueroso.

Do mesmo jeito que eu falei do cinema paraibano, talvez o cinema brasileiro de horror esteja vivendo a sua aurora. Todas essas produções podem fazê-lo criar um corpo para além do corpo de Mojica.

 

CF: Quais são os seus próximos projetos?

RM: Temos dois projetos em fase de desenvolvimento que devem entrar em produção no próximo ano. O primeiro se chama Nó do Diabo, que é um seriado de cinco episódios de 25 minutos; a gente planeja fazer a versão em longa-metragem desse mesmo projeto. É uma história que se passa entre 1815 e 2015 e fala sobre uma fazenda escravocrata dos dias de hoje ate o ápice da escravidão. O trabalho vai abranger vários subgêneros do horror, como fantasmas e zumbis.

O outro projeto é o meu primeiro longa-metragem na direção e se chama A Noite Amarela, uma espécie de coming-of-age com horror, uma história de adolescentes que estão comemorando o fim do ensino médio e de repente se dão conta de que vão morrer.

 

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Serviço

Retrospectiva da Vermelho Profundo na 9ª CineBH – Mostra Internacional de Cinema de Belo Horizonte

Dia 17/10, às 21h30, no Cine 104
– Exibição de Enquanto a Justiça Tarda (Fabiano Raposo), Mais Denso Que Sangue e Cova Aberta (ambos de Ian Abé)

Dia 18/10, às 21h, no Cine 104

– Exibição de  Os Mortos (Jhésus Tribuzi), O Hóspede (Ramon Porto Mota e Anacã Agra) e O Desejo do Morto (Ramon Porto Mota)

 

Mais informações em: http://www.cinebh.com.br/index.php

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